sexta-feira, 22 de março de 2013



Publicado artigo de minha autoria no Jornal Estado de Minas do dia 22/03/2013
(Caderno Direito & Justiça, p. 3).


O Simbolismo da “Nova Lei Seca”

Warley Belo
Advogado, Diretor do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, Mestre em Ciências Penais / FD - UFMG, Professor da Faculdade de Ciências Jurídicas Professor Alberto Deodato, Professor Convidado da Pós-graduação em Ciências Penais da FD - UFJF, autor do livro “Tratado dos Princípios Penais” (Bookess, 2012).


            A Lei 12.760, de 20 de dezembro de 2012, introduziu importantes modificações no Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9503/97). A “nova lei seca” vai funcionar ou é somente mais uma satisfação simbólica do Poder Legislativo?
            Sem dúvida alguma, a nova lei penal é mais rigorosa do que a anterior. Porém, é só outro exemplo da perniciosa expansão do Direito Penal incapaz de reduzir os números de mortos nas estradas ou de motoristas embriagados.
            Esta atual lei foi motivada em razão do que decidiu o STJ quando passou a exigir prova técnica (bafômetro ou exame de sangue) para se aferir a taxa de alcoolemia para o crime de condução de veículo sob efeito de álcool. É que a anterior Lei 11.705, de 19 de junho de 2008, inseriu no tipo do artigo 306, CTB o número cabalístico de 6 decigramas de álcool por litro de sangue. Essa crassa exigência não existe mais no atual tipo principal, nada obstante incapaz de retroagir para alcançar os fatos praticados antes do dia 20 de dezembro de 2012, que continuam a exigir o exame pericial, porquanto, à época, era imprescindível a referida prova técnica para se demonstrar a concentração de álcool por litro de sangue.
            Não se pode confundir essa legislação penal com a legislação administrativa. O Conselho Nacional de Trânsito (Contran) regulamentou, através da Resolução 432, a tolerância zero, ou seja, qualquer quantidade de álcool no sangue do condutor já é capaz de produzir as punições administrativas. Isso significa que um bombom com licor ou um copo de cerveja ou um enxaguante bucal com álcool podem configurar a infração. Mas, nesses casos, o bafômetro não acusará nenhuma quantidade de álcool após 15 minutos do consumo. Tanto no caso da infração administrativa quanto do crime, pode-se fazer a prova da embriaguez pela opção técnica do bafômetro ou exame de sangue, mas, também, por outros meios de prova para a confirmação do estado alterado do condutor como a prova testemunhal, imagem, vídeo ou qualquer outro meio de prova em direito admitido.
            Aqui surge uma questão porque o testemunho do agente de trânsito é válido como prova. Sua palavra pode condenar uma pessoa. Cabe ao condutor comprovar que o agente de trânsito está errado ou mentindo. Problemas de cunho emocional ou cansaço podem produzir um aspecto de “falsa embriaguez” como olhos vermelhos e voz embargada. Neste caso, apresenta-se como um cristalino direito do condutor fazer a sua contraprova com o teste do bafômetro, uma vez que contra ele pesa uma presunção de embriaguez. A não existência do aparelho poderá ser interpretada em favor do condutor, pois, em matéria punitiva, não se deve tolerar sistemas probatórios bipolares. Quer dizer, é possível comprovar a embriaguez através do bafômetro ou de outras provas, entretanto estas outras provas só podem ser utilizadas se não existir o bafômetro ou se o condutor não colaborar. Os outros meios de prova são mecanismos claramente subsidiários, quando pouco, corroborativos do teste pericial. Se o condutor quer realizar o teste do bafômetro, mas este não existe, não se pode – por comodismo arbitrário – lançar mão da ineficiência estatal para condená-lo com elementos probatórios secundários. Isso geraria uma instabilidade e uma insegurança jurídica.
            Não se pode descurar igualmente que andou mal o Legislador ao insistir no crime como um perigo abstrato. A desnecessidade de se provar um perigo criado pelo condutor, bastando o descumprimento da norma para a caracterização do crime, não satisfaz a exigência de um Direito Penal fundado na teoria do bem jurídico, ponto elementar de um Direito Penal democrático. A antecipação da punição por um eventual ato perigoso desvirtua o Direito Penal e abre reais possibilidades de seu abuso porque expande os limites mínimos de um Direito Penal de garantias. Abandona-se a proteção ao bem jurídico em prol de normatizações de condutas. O crime do artigo 306 é, assim, uma ficção jurídica, um capricho do Legislador.
            Melhor caminho para infrações de perigo abstrato seria tratá-las em instâncias extra-penais e não penais porque flagrantemente violadora do princípio da lesividade e da ideia liberal de ultima ratio.
            Por fim, na prática do crime, que é afiançável, a pena é de detenção de seis meses a três anos e multa. A multa era de R$ 957,65, agora é de R$ 1.915,40. Ainda há o recolhimento da habilitação, a suspensão do direito de dirigir por 12 meses, além da retenção do veículo, salvo se apresentar outro condutor habilitado. A lei prevê, ainda, caso o motorista reincida num prazo de um ano, o valor da multa será duplicado chegando a R$ 3.830,60, além da suspensão do direito de dirigir por doze meses.
            Muito mais eficaz do que o recrudescimento punitivo, seria a educação, a melhoria da engenharia viária, a eficiência dos transportes públicos e uma fiscalização efetiva. Mas essas atividades não são tão fáceis quanto a mudança de um artigo de lei e nem agrada tanto a sociedade brasileira que é, cada vez mais, autoritária em questões criminais.
            Apesar do deslumbramento social, há mais simbolismo do que inteligência na “nova lei seca”. 

terça-feira, 12 de março de 2013

Publicado modelo de habeas corpus de minha autoria no site do Prof. Luiz Flávio Gomes (Atualidades do Direito) sobre o banco dos réus no tribunal do júri. Modelo de habeas corpus e decisão (Atualidades)
Artigo de minha autoria sobre recurso representativo de controvérsia foi publicado no Espaço Vital. Artigo no site

terça-feira, 5 de março de 2013


O recurso representativo de controvérsia como uma reanálise prévia do mérito 
e a afronta a ampla defesa criminal

Prof. Me. Warley Belo
Advogado Criminalista

Com a nova sistemática do artigo 543-C do CPC, o recurso representativo de controvérsia corre o risco de expandir os pré-requisitos dos recursos extremos, fora da previsão constitucional. É que se passou a negar seguimento ao Recurso Especial, nos termos do art. 543-C, § 7º, inc. I, do Código de Processo Civil, numa interpretação fora dos parâmetros da ampla defesa.
            A norma do art. 544 do CPC, editada no mesmo momento, deve ser interpretada com base na ampla defesa incidindo nos casos para os quais o agravo de instrumento, hoje agravo, simplesmente, foi criado. Ou seja, nas hipóteses em que o órgão judicante do Tribunal de origem tenha extrapolado os requisitos de admissibilidade do Recurso Especial.
            O exame dos mencionados pressupostos recursais, sem dúvida, não alcança a norma do inciso I do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil. É que nesse dispositivo usado como fundamento da negação do seguimento, há verdadeiro julgamento do mérito que serviu de paradigma ou, como dispõe a própria lei, de "recurso representativo de controvérsia" (§ 1º do mesmo dispositivo).
            Deste modo, os Tribunais inferiores estão criando um novo requisito para o Recurso Especial. Cria-se um novo requisito, por via pretoriana, à margem da Constituição (art. 105, III). A fonte normativa primária da matéria não pode ser deixada de lado. A Constituição da República não prevê esse tipo de interpretação, antes pelo contrário, quer garantir o acesso amplo aos Tribunais superiores, ainda mais em questão de liberdade, como ocorre no processo penal. Dentro desta interpretação, nem mesmo na lei processual civil (CPC, arts. 541 e seguintes) se pode perquirir tamanho cerceamento do Recurso. Mesmo porque o Recurso Especial pode ter vários fundamentos, não só a contrariedade à decisão do STJ.
            Estamos assim, de frente a uma verdadeira criação pretoriana, uma inovação perigosa porque atípica e castradora de Recurso. E piora muito mais a situação quando se percebe que a negativa de seguimento tem base na análise de mérito no Tribunal inferior quando não mais possui competência para a análise do mérito. Está se considerando o art. 543-C do CPC como um mecanismo de reabertura de análise do mérito pelo Tribunal a quo. Isso é verdadeiramente criar um novo sistema de julgamento à margem da Constituição da República.
            Na verdade, procura-se simplesmente negar ao Jurisdicionado acesso ao STJ, no caso. Os Tribunais inferiores, neste caminho, estão verdadeiramente sistematizando um tipo de súmula vinculante antecipada, ainda na origem.  Em outras palavras, é um mecanismo que visa paralisar o raciocínio jurídico nos Tribunais. Uma vez que se confere aos precedentes, na interpretação fechada do art. 543-C, CPC, um mecanismo de se negar seguimento aos recursos, estaremos fadados a ter decisões imutáveis porque não se terá caminho adequado para provocar eventual mudança de posicionamento. Nem mesmo na Common Law, onde se tem os precedentes num patamar muito mais elevado do que no nosso sistema, cultuam de maneira tão absoluta as decisões anteriores ao ponto de admitir que um Tribunal inferior paralise o seguimento de um recurso “reanalisando previamente o mérito” com base em uma decisão que entende paradigma.
            Não se pode deixar de observar também que as decisões judiciais subordinam-se à cláusula rebus sic stantibus, exigindo revisão para adequar-se a um novo modelo de direito ou de fato, como parece ser um sistema mais óbvio de atualização do pensamento jurídico.
         Tal posicionamento dos Tribunais inferiores vai mesmo de encontro com todo um sistema democrático recursal. Se pararmos para observar, nem mesmo se limita de maneira absoluta recursos que contrariem súmulas vinculantes editadas pelo STF porque, mesmo nesse extremo exemplo, há mecanismos de revisão (CF, art. 103-A, § 2º e Lei 11.417/06, arts. 3º a 6º). Do mesmo mote com as decisões do STF que negam existência de repercussão geral (CPC, art. 543-A, § 5º). E mesmo no âmbito do STJ, pode-se propor revisão de suas próprias súmulas (Regimento Interno, art. 125).
            Desta forma, deve-se protestar com veemência essa criação pretoriana de limitar o acesso aos tribunais superiores com uma verdadeira análise antecipada do mérito fora de propósito e competência. 

segunda-feira, 4 de março de 2013

Jornal Hoje em Dia - 02/03/13 p. 17 - Resposta ao leitor - Caso de trote / ameaça.