Em ação de investigação de paternidade post mortem, o Tribunal indeferiu a exumação cadavérica com base em artigo do Prof. Warley Belo.

Processo: 2012.088793-5 (Acórdão)
Relator: Denise de Souza Luiz Francoski
Origem: Lages
Orgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Civil Juiz Prolator: Francisco Carlos Mambrini
Classe: Agravo de Instrumento
Agravo de Instrumento n. 2012.088793-5, de Lages
Relatora: Desa. Denise de Souza Luiz Francoski AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE POST MORTEM C/C PETIÇÃO DE HERANÇA - DECISÃO QUE ENTENDEU SER
NECESSÁRIA A PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL COM A CONSEQUENTE EXUMAÇÃO DO CADÁVER DO SUPOSTO PAI - INSURGÊNCIA DOS
DESCENDENTES/ AGRAVANTES.
EXUMAÇÃO DE CADÁVER É MEDIDA EXCEPCIONAL CONSIDERANDO-SE O PRINCÍPIO DE RESPEITO AOS MORTOS E TAMBÉM O FORTE DESGASTE
EMOCIONAL QUE CAUSA AOS FAMILIARES.
NECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DOS OUTROS MEIOS DE PROVA DA PATERNIDADE.
ATUALMENTE É POSSÍVEL VERIFICAR A PATERNIDADE ATRAVÉS DE PERÍCIA TÉCNICA INDIRETA POR MEIO DE COLETA DO MATERIAL GENÉTICO DOS
SUPOSTOS IRMÃOS BIOLÓGICOS E ESSA PROVA NÃO FOI PRODUZIDA NOS AUTOS.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 2012.088793-5, da comarca de Lages (Vara da Família), em que são agravantes
G. P. A. e outros, e agravado M. G. C.:
A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Sebastião César Evangelista, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Saul
Steil.
Florianópolis, 27 de fevereiro de 2014.
Denise de Souza Luiz Francoski
Relatora
RELATÓRIO
Trata-se de Recurso de Agravo de Instrumento interposto por G.P.A e outros contra decisão interlocutória da lavra do Juiz de Direito da Vara da Família
da Comarca de Lages, que em Ação de investigação de paternidade post mortem c/c petição de herança, movida por M.G.C, que entendeu ser
necessária a produção de prova pericial com a consequente exumação do cadáver do suposto pai (fl. 09).
Aduziu que a decisão poderá causar evidente lesão grave e de difícil reparação aos agravantes, pois causará forte abalo emocional aos herdeiros,
especialmente a viúva que possui 74 anos e está com a sua saúde debilitada.
Defendeu que "o suposto "pai" deixou três descendentes, o que torna possível o cruzamento de material genético destes com o da Agravada."(fl.05)
Argumentou que a decisão confronta o entendimento pacífico desse Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina de que "a exumação de cadáver é
uma medida extrema, utilizada somente quando já esgotados todos os outros meios de prova."(fl.05)
Pugnou pela reforma da decisão hostilizada e, preliminarmente, pela concessão de efeito suspensivo sob o argumento de existência do periculum in ora
e do fumus boni iuris.
Em decisão monocrática (fls. 40/41), foi deferido o pedido de efeito suspensivo postulado "para que a coleta do material para exame de DNA se
restrinja, tão só, aos agravantes, possíveis irmãos da investiganda".
O Ministério Público opinou pelo provimento do agravo de instrumento pois entendeu que o investigado deixou três descendentes e, portanto, não foram
esgotados os métodos alternativos de produção de prova.
Argumentou que " o requerimento de exumação de cadáver é medida de caráter essencialmente excepcional, porquanto ocasiona enorme desgaste
emocional aos familiares."(fl.49)
É o relatório.
VOTO
2.1 Da Admissibilidade
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. 2.2 Do Objeto recursal
Em análise aos autos, observa-se que, inconformados com a decisão proferida em primeiro grau, os Agravantes objetivam, em síntese,
a reforma da decisão para que seja realizado o exame de DNA somente nos descendentes do suposto "pai".
2.3 Do mérito
É sabido que, por que é o destinatário das provas, o juiz pode delimitar aquelas que considera necessárias e indeferir aquelas que
considerar protelatórias.
No entanto, dada a excepcionalidade da exumação de cadáver, parte da doutrina defende que tal prova pericial só pode ser deferida se
restarem comprovados dois requisitos, quais sejam a necessidade e a pertinência da medida, conforme manifestação do Ministério
Público, que acompanho na íntegra:
É sabido que a identificação da paternidade e o reconhecimento do estado de filiação são direitos subjetivos indisponíveis, inalienáveis
e imprescritíveis, integrantes da dignidade da pessoa humana.
Nessa senda, a relevância da matéria versada nas ações de investigação de paternidade importa na necessidade da busca da verdade
por todos os meios probatórios em direito admitidos, especialmente por meio de exame técnico-científico de DNA.
Pois bem. Cabe ressaltar que o deferimento de diligências é ato que se inclui na discricionariedade regrada do juiz.
Mas, via de regra, como afirma Warley Belo, tal discricionariedade deverá se ater a dois pré-requisitos básicos para deferir a
exumação: a necessidade e a pertinência da medida. (BELO, Warley. A exumação cadavérica como meio de prova. Revista Magister
Direito Penal e Processual, Ed. Magister, nov/12)
Nesse sentido, a exumação pode ser suprida por outros meios de prova, como análise de fotografias, testemunhas e exames de DNA
de parentes próximos, motivo pelo qual se percebe que a medida adotada pelo Magistrado não atende a tais requisitos, pois o
requerimento de exumação de cadáver é medida de caráter essencialmente excepcional, porquanto ocasiona enorme desgaste
emocional aos familiares.
Dos autos extrai-se que o investigado deixou três descendentes, portanto, não esgotados os métodos alternativos de produção de
prova, aconselhável a realização do exame de DNA a ser coletado dos Agravantes.(fls.48/50)
Assim, verifica-se que a perícia através de exumação de cadáver é medida excepcional considerando-se o princípio de respeito aos
mortos e também o forte desgaste emocional que causa aos familiares.
Por isso, justifica-se que tal prova pericial seja realizada somente quando esgotados todos os outros meios de prova possíveis para
apurar a eventual paternidade do investigado.
Atualmente é possível verificar a paternidade através de perícia técnica indireta por meio de coleta do material genético dos supostos
irmãos biológicos.
No caso em questão o suposto pai deixou três descendentes porém a referida prova ainda não foi realizada. Assim, ainda não foram
esgotados todos os meios de prova e a perícia através da exumação do cadáver mostra-se desnecessária.
No sentido de indeferir a exumação de cadáver quando há a possibilidade de efetuar a perícia técnica indireta através de coleta do
material genético de descendentes do investigado, temos os seguintes julgados do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE POST MORTEM C/C PETIÇÃO DE HERANÇA. PLEITO
RECURSAL IMPUGNANDO DECISÃO QUE DETERMINOU A EXUMAÇÃO DO INVESTIGADO. SUBSISTÊNCIA. MEDIDA EXCEPCIONAL.
AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO DESIGNADA PARA DATA PRÓXIMA (27/06/2013). ADEMAIS, A ORDEM DE COLHEITA DE PROVAS
PREVISTA NO ARTIGO 452, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL NÃO É PEREMPTÓRIA. ASSIM, POSSIBILIDADE DE O MAGISTRADO, DESTINATÁRIO DA
PROVA, DECIDIR OPORTUNAMENTE PELA FORÇA PROBANTE DA PROVA TESTEMUNHAL A SER COLHIDA QUANTO PELA REALIZAÇÃO DA PROVA
TÉCNICA MAIS ADEQUADA AO DESLINDE DA CAUSA. SEM SE OLVIDAR, CONTUDO, DA POSSIBILIDADE REAL DE PERÍCIA TÉCNICA INDIRETA
POR MEIO DE COLETA DE MATERIAL GENÉTICO DOS DESCENDENTES BIOLÓGICOS DO INVESTIGADO. AUSÊNCIA DE RECUSA EXPRESSA
DOS AGRAVANTES EM FORNECER MATERIAL GENÉTICO PARA EXAME DE DNA. IMPERIOSA NECESSIDADE DE RESPEITO À DIGNIDADE DO
FALECIDO A SER CONSIDERADA NOS CASOS DE EXUMAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. "[...] desnecessária a exumação do
cadáver do de cujus, pois, como já salientado, tratar-se-ia de medida extrema, não justificável no presente caso. Ressalte-se que o
respeito aos mortos é um princípio de importância relevante, não devendo ser infringido quando o caso concreto apresentar outro
meio de solução, até mesmo em observação aos princípios da economia e celeridade processual.[...]" (Apelação Cível n. 2011.024509-3,
Rel. Des. Carlos Prudêncio, julgada em 09/10/2012) (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2011.044473-2, de Ibirama, rel. Des. Denise Volpato, j. 23-04-
2013).(sem grifo no original)
No mesmo sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - INVENTÁRIO - DECISÃO QUE REJEITA O PEDIDO DE EXUMAÇÃO DOS RESTOS MORTAIS DA AUTORA DA
HERANÇA PARA FINS DE COMPROVAÇÃO DO ALEGADO GRAU DE PARENTESCO, BEM COMO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À DELEGACIA DE
POLÍCIA PARA OBTENÇÃO DOS DADOS REGISTRAIS DO GENITOR DA RECORRENTE - HERDEIROS QUE SUSTENTAM TER LEGITIMIDADE PARA
POSTULAR A PARTILHA DO ACERVO HEREDITÁRIO - POSTERIOR PRONUNCIAMENTO DO MAGISTRADO SINGULAR, QUE DETERMINOU FOSSEM
DIVULGADAS INFORMAÇÕES ACERCA DOS ASCENDENTES PATERNOS DA INSURGENTE - PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE RECURSAL QUANTO
A ESTE REQUERIMENTO - MEIOS DE PROVA PARA DEMONSTRAÇÃO DO VÍNCULO SANGÜÍNEO POSSIVELMENTE EXISTENTE ENTRE A DE
CUJUS E OS SUPOSTOS NETOS NÃO ESGOTADOS - VIOLAÇÃO DO SEPULCRO PARA COLETA DE MATERIAL GENÉTICO DISPENSÁVEL -
PERÍCIA TÉCNICA INOPORTUNA - NEGATIVA DE ACESSO À JUSTIÇA NÃO EVIDENCIADA - PROVIDÊNCIA QUE, POR ORA, SE REVELA
DESNECESSÁRIA - MANUTENÇÃO DO DECISUM VERGASTADO QUANTO À DENEGADA AUTORIZAÇÃO PARA A EXUMAÇÃO DO CADÁVER - RECURSO
PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO. É certo que "os netos, assim como os filhos, possuem direito de agir, próprio e personalíssimo, de pleitear
declaratória de relação de parentesco em face do avô, ou dos herdeiros se pré-morto aquele", porque "o direito ao nome, à identidade e à origem
genética estão intimamente ligados ao conceito de dignidade da pessoa humana" (STJ. Recurso Especial nº 807.849/RJ, Relatora : Ministra Nancy
Andrighi, j. 24/03/2010). Todavia, revela-se desnecessária a produção da prova técnica objetivada, devendo-se primeiramente esgotar
todas as possibilidades outras de se obter a comprovação do aludido vínculo genético, o que não restou demonstrado na espécie.
(TJSC, Agravo de Instrumento n. 2011.021421-8, de Armazém, rel. Des. Luiz Fernando Boller, j. 10-11-2011).(sem grifo no original)
Colaciono também:
DIREITO CIVIL - FAMÍLIA - INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE CONTRA FALECIDO - INTERLOCUTÓRIO QUE DETERMINOU A
EXUMAÇÃO DO CADÁVER - INCONFORMISMO DOS SUCESSORES DO INVESTIGADO - DESERÇÃO RECURSAL - PRELIMINAR RECHAÇADA - BENEFICIÁRIOS DA JUSTIÇA GRATUITA - DISPENSA DE PREPARO - RECURSO CONHECIDO - EXUMAÇÃO - MEDIDA EXCEPCIONAL - DESNECESSIDADE -
EXAME DNA ENVOLVENDO FILHAS DO INVESTIGADO, INVESTIGANDO E SUA REPRESENTANTE - EXCLUSÃO DA PATERNIDADE - AUSÊNCIA DE OUTRAS
PROVAS - DECISUM CASSADO - RECURSO PROVIDO. A parte beneficiada com a justiça gratuita é dispensada do recolhimento de qualquer numerário. A
exumação de cadáver em ações investigatórias de paternidade deve restringir-se a hipóteses excepcionais, mostrando-se
desnecessária a sua produção quando existente exame DNA, mormente quando não coletados outros meios de prova. (TJSC, Agravo de
Instrumento n. 2007.008747-4, de Brusque, rel. Des. Monteiro Rocha, j. 28-02-2008).(sem grifo no original)
E ainda:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO, NEGATÓRIA DE PATERNIDADE E MATERNIDADE - PERÍCIA - NECESSIDADE DE
NOMEAÇÃO DE PERITO JUDICIAL - EXEGESE DO ART. 421 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - DECISÃO REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO.A realização da prova pericial encontra-se condicionada ao preenchimento dos termos do art. 421 do Código de Processo Civil, tornando
indispensável a nomeação de perito pelo juízo. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA - SUPOSTO GENITOR FALECIDO - PERÍCIA COM A
EXUMAÇÃO DO CADÁVER - DESNECESSIDADE - REALIZAÇÃO DO EXAME DE DNA EM TODOS OS POSSÍVEIS IRMÃOS UNILATERAIS DO
AUTOR - EXAME TÉCNICO NO CROMOSSOMO Y DO MENOR - DETERMINAÇÃO EX OFFICIO.Nas ações de investigação de paternidade deverá sempre
ser almejada a verdade, se não for a real, pelo menos a mais próxima dela, pois a questão básica deste feito é saber quem é o verdadeiro genitor dos
investigantes. Com o avanço da tecnologia, em especial nos exames de DNA, torna-se desnecessária, a priori, a exumação de cadáver
investigando, para perícia técnica, sendo possível a realização nos meio-irmãos do autor, assim como, no cromossomo y, do mesmo,
nestes autos. "A maioria destes casos são também resolvidos, dependendo da quantidade de participantes do lado do investigado
falecido. A probabilidade de conclusão é proporcional ao número de filhos ou tios analisados" (Identificação humana, coordenador:
Domingos Tochetto, Porto Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 1999, p. 266). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2005.012238-7, de São Domingos, rel. Des.
Dionízio Jenczak, j. 26-08-2005).(sem grifo no original)
Dessa forma, considerando-se que no caso em questão ainda não foram esgotados todos os meios de prova, pois não foi realizada a perícia técnica
indireta através de coleta do material genético de descendentes do investigado, mostra-se desnecessária e impertinente a perícia através de exumação
do cadáver.
Do dispositivo
Ante o exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento.
Este é o voto.
Gabinete Des. Denise de Souza Luiz Francoski
Fonte: 05/10/2017 Jurisprudência Catarinense - TJSC http://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/html.do?q=INVESTIGA%C3%87%C3%83O%20DE%20PATERNIDADE%20POST%20MORTEM&only_ement…