terça-feira, 29 de setembro de 2015

Como fazer um pôster científico


Existem diferentes formas de comunicação científica, tanto escritas quanto orais. Os pôsteres são uma mistura de várias formas. Portanto, a elaboração de um pôster deve levar em conta ao mesmo tempo técnicas de redação científica e de palestras. Técnicas usadas na área de comunicação para fazer cartazes e outdoors também ajudam muito.
Vale lembrar que a mensagem contida em um pôster é apresentada em condições bem peculiares: geralmente, em uma sala lotada, com dezenas, centenas ou mesmo milhares de outros pôsteres sendo apresentados simultaneamente, concorrendo também com cocktails e cafezinhos. A maioria das pessoas que comparece a uma sessão de pôsteres está a fim de socializar; portanto, chamar a atenção e conseguir boas discussões é um grande desafio. Apesar dessas complicações, os pôsteres têm uma grande vantagem em relação às palestras: eles permitem uma interação mais pessoal e com menos restrição de tempo. O grande pulo do gato é saber como atrair os visitantes no meio da multidão.
Este guia foi feito para ajudar você a elaborar seus pôsteres de uma maneira mais eficiente, evitando desperdiçar seu tempo e seu dinheiro por não receber visitantes ou não conseguir ter conversas produtivas durante a sessão de apresentação. É sempre preferível apresentar uma palestra do que um pôster, contudo poucos têm essa oportunidade em congressos, sendo essa uma honra reservada aos colegas mais experientes ou com trabalhos mais inovadores. A esmagadora maioria dos participantes de um congresso comunica suas descobertas por meio de pôsteres. Portanto, dominar essa forma de comunicação é essencial para novatos que estão buscando seu espaço na comunidade científica. Vale destacar, entretanto, que um pôster e um resumo em um congresso não são publicações de verdade, mas apenas uma propaganda do seu trabalho, que têm a função de deixar as pessoas ansiosas pelo artigo de verdade.
Como fisgar visitantes?
Como dito anteriormente, muitas vezes os pôsteres são apresentados em condições bem adversas e enfrentam uma competição brutal por atenção. Normalmente, você terá apenas uma hora para atrair o máximo possível de visitantes, fazer novos contatos com colegas interessados nos mesmos temas e conseguir ter pelo menos uma conversa mais aprofundada. Sendo assim, como é possível se destacar na multidão? Há três maneiras principais:
  1. Fazendo ótimas ilustrações: ilustre seu trabalho com figuras realmente bonitas, de preferência coloridas, como fotos de alta qualidade (alta resolução, boa nitidez e bom enquadramento) e gráficos bem feitos. É preciso que uma figura central no pôster fisgue os visitantes à distância, fazendo-os ignorar os trabalhos ao redor e compelindo-os a se aproximar do seu pôster. Entretanto, não apele, pois apelações atraem visitantes, mas podem destruir reputações. Por exemplo, evite usar fotos que chocam a maioria das pessoas (nu, violência, escatologia etc.) ou frases com termos chulos;
  2. Criando um título instigante: crie um título conciso, informativo e chamativo, como uma boa manchete de jornal. Use palavras que chamem a atenção e que despertem curiosidade. Prefira os termos que estão na moda na sua área de pesquisa. Use fontes grandes no título e um fundo diferente do resto do pôster, a fim de dar maior ênfase à sua manchete. O título é a segunda isca, quase tão importante quanto as figuras centrais;
  3. Usando as cores de forma inteligente: use um esquema de cores que seja ao mesmo tempo atraente, mas que não canse o leitor. Use cores mais quentes nas bordas e cores mais frias para contrastar com o texto. Use as cores também para se comunicar: cores similares para coisas similares. Por exemplo, se estudou três espécies, use uma cor para cada uma, repetindo essa cor em gráficos e textos.
Qual deve ser a estrutura básica de um pôster científico?
De maneira geral, os pôsteres seguem o mesmo esqueleto básico das palestras e artigos (IMRAD), mas com variações. Por exemplo, não se incluem resumos, citações e nem palavras-chave (que entram apenas no resumo que sair nos anais do evento) em um pôster. Além disso, é melhor evitar criar uma seção inteira para discussão: discuta em uma frase cada resultado e faça uma seção à parte apenas com as conclusões principais. A diagramação (layout) também deve ser bem diferente da de um artigo.
  1. Destaque o título: permita que um visitante em potencial saiba facilmente do que trata o trabalho. Muitas pessoas colocam uma foto do apresentador do pôster logo abaixo do título, para facilitar sua identificação no local, pois geralmente colegas de instituições diferentes só se conhecem pelos sobrenomes, não pelos rostos;
  2. Destaque os objetivos e conclusões: a maioria das pessoas quer saber essas duas coisas primeiro, logo de cara, para decidirem quanta atenção darão a um determinado pôster.
  3. Use fontes grandes: por exemplo, 24 pt para o texto, 34 pt para os cabeçalhos e 70 pt para o título. Uma pessoa deve ser capaz de ler o pôster confortavelmente a 1,5 m de distância. Cuidado com fontes incomuns, que podem não estar disponíveis na gráfica da esquina. Dê preferência a fontes não serifadas (sem ornamentos), tais como Arial, Verdana ou Tahoma, pois elas facilitam a leitura à longa distância. Evite misturar fontes muito diferentes;
  4. Diagrame bem as seções: elas devem estar bem separadas uma das outras, a fim de facilitar para o visitante reconhecer onde está cada seção do trabalho. Costuma-se dividir o pôster em três colunas, para que fique mais amigável à leitura;
  5. Ilustre bem o pôster: as figuras devem ser atraentes o suficiente para chamarem a atenção de visitantes que nem mesmo sabem qual é o tema do pôster. Tome cuidado com o contraste do pôster, de modo que o texto fique bem legível e o esquema de cores esteja combinando. Evite usar figuras complexas como fundo. Prefira fundos lisos ou com texturas simples. Se quiser mesmo usar uma figura como fundo, torne-a mais homogênea, diminuindo seu contraste e aumentando ou diminuindo seu brilho. Use cores quentes, como vermelho, amarelo ou laranja para molduras, e cores frias, como branco e bege, para os fundos de textos. Uma boa estratégia é colocar a principal ilustração do seu trabalho bem no meio do pôster;
  6. Use pouco texto: um bom pôster deve ter pouco texto. Não tão pouco quanto uma apresentação de slides, porém bem menos do que um artigo. É preferível usar frases telegráficas, diretas e curtas, organizadas em tópicos, ao invés de orações longas e estruturas complexas. Deve haver uma ênfase maior nos objetivos e nas conclusões gerais. Se possível, organize e apresente a lógica argumentativa da introdução, objetivos e conclusões na forma de diagramas, por exemplo, fluxogramas e diagramas de Venn. Deve-se fazer nenhuma ou pouquíssimas citações.
Como devem ser as cores do pôster?
Pode parecer bobagem, mas é muito importante planejar bem o esquema de cores de um slide. Há toda uma psicologia por trás das cores, que influencia a nossa forma de receber, processar e guardar uma mensagem. Um slide precisa ser ser bonito e também causar a impressão visual correta, de acordo com o impacto que você quer causar no público. Enquanto um esquema de cores pode fazer os espectadores dormirem, um outro esquema pode deixá-los agitados, tristes, alegres ou pensativos. Leve em conta também o “humor” do tema da sua palestra ao definir o esquema de cores: uma palestra sobre um tema pesado e triste como o câncer talvez não fique bem com um esquema de cores a la MacDonald’s…
Como devem ser as figuras?
As figuras são peças-chave em um pôster e devem ter um grande destaque (veja um outro guia sobre figuras). São elas que, em um primeiro momento, fisgarão os visitantes. Em um segundo momento, são as figuras que vão ajudar a entender seu trabalho e dar sustentação aos seus argumentos, de maneira muito mais eficaz do que os textos, quando bem combinadas com os diagramas e esquemas. Portanto, capriche e nunca deixe de citar as fontes das figuras que pegar emprestadas. Plágio, mesmo que de uma ilustração, é uma desonra para um cientista.
  1. Fotos: use apenas fotografias de alta qualidade, coloridas, com alta resolução, bom contraste, bom brilho e boa nitidez, além de um enquadramento interessante e um tema bem definido. Se só tiver fotos ruins, deixe-as de lado e use apenas gráficos e esquemas. Hoje em dia, com a popularização da fotografia digital, muitos se sentem tentados a abusar de fotos em pôsteres, porém deve-se usar esse recurso com muito critério e é importante ter noção das próprias limitações como fotógrafo amador. Na grande maioria dos casos, usa-se um número excessivo de fotos nos pôsteres, ou fotos que não ajudam em nada a entender o trabalho; isso, fora as fotos de péssima qualidade, que mal permitem reconhecer o organismo de estudo. Lembre-se de que nem todo mundo acha fofo o animal que você estuda;
  2. Desenhos: em alguns casos, desenhos podem ser bem mais úteis do que fotos. Fotos ganham pela realidade, enquanto a vantagem dos desenhos é permitir ressaltar alguma estrutura fundamental do organismo de interesse. Use-os sempre que possível, mas apenas se souber desenhar bem ou puder contratar um ilustrador científico;
  3. Gráficos: se você puder passar uma mensagem em 2D, nunca o faça em um gráfico 3D, pois ficará mais difícil ver as diferenças entre os dados. Não use fundos com texturas e nem linhas de grade, que atrapalham a compreensão. Use uma fonte grande para os títulos dos eixos. Lembre-se de que um gráfico precisa ser auto-explicativo, especialmente em um pôster, onde ninguém quer parar para ler uma legenda. Quanto mais simples for um gráfico, melhor. Mas não seja minimalista demais, como em um artigo – torne seu gráfico atraente sem prejudicar a transmissão da mensagem principal.
  4. Esquemas: se possível, apresente suas argumentações centrais (deduções e induções) na forma de esquemas, como fluxogramas, pirâmides, organogramas, diagramas de Venn ou outros. É muito mais rápido e fácil entender a lógica das interpretações que você fez por meio de esquemas. Use-os tanto para apresentar hipóteses e previsões nos objetivos, quanto para ligar fatos a interpretações na discussão.
  5. Legendas: devem ser muito concisas. Assim como em um artigo, use as legendas para chamar a atenção do leitor para a moral da história; não fique descrevendo a figura ou tabela. No caso de um pôster, a mensagem deve ser mais direta ainda.
Quais são os erros mais comuns?
Há vários erros muito recorrentes nos pôsteres em congressos. Aqui apresento alguns deles:
  1. Ficar na frente do pôster durante a sessão: este é um erro tolo, mas infelizmente muito comum. Como alguém pode ser atraído e ler o seu pôster, se você ficar na frente dele, cobrindo-o? Um outro erro geralmente associado a este é ficar de bate papo com um amigo ao lado do pôster, deixando seus visitantes constrangidos de interromper o papo e lhe fazer perguntas. Deixe o social com os velhos conhecidos para depois da apresentação;
  2. Escrever um pôster como se faz um artigo: muitas pessoas enchem seus pôsteres de texto, tornando-os insuportavelmente densos para a situação. Isso só serve para afastar visitantes. Lembre-se: você estará ao lado do pôster durante a sessão oficial e, portanto, poderá explicar muitas coisas oralmente. Como já dito, um pôster é uma mistura de comunicação escrita e oral;
  3. Subestimar a importância da diagramação: tão importante quanto fazer um bom roteiro e ter um bom conteúdo é saber organizar bem as partes de um pôster. Gaste um bom tempo pensando em como diagramar seu pôster, de modo que ele seja fácil de ler e atraente ao mesmo tempo. Não deixe nada nas bordas do pôster, pois sempre podem acontecer problemas na impressão. Além disso, as bordas estão mais sujeitas a amassarem ou rasgarem. Não deixe espaços vazios no meio, que dão uma impressão de desordem. Alinhe bem os elementos;
  4. Escolher um esquema de cores ruim: muito cuidado com as cores! Escolha cores atraentes para as molduras e calmas para o fundo dos textos. Combine bem as cores, tornando seu pôster elegante e atraente, nunca brega ou ridículo, muito menos ilegível;
  5. Usar um papel ruim: se possível, faça o pôster em um papel que dê boa nitidez às figuras e seja resistente, como um glossy “plastificado”, por exemplo. Lembre-se de todos os perigos que o pôster vai enfrentar na viagem até o congresso;
  6. Usar fontes pequenas: não adianta o pôster estar bonito, se as fontes forem pequenas demais para serem lidas a 1,5 m de distância. Isso afugentará os visitantes;
  7. Não fazer um test-drive: se possível, antes de mandar o pôster para a impressão definitiva, imprima uma versão em A4 para fazer um test-drive e ver se está tudo funcionando bem.
Layouts não-convencionais podem ser uma boa!
Cientistas são famosos por produzirem pôsteres que até podem ser eficientes, mas que são visualmente muito crus, sem sal. Se você quiser ousar, tente aplicar técnicas e layouts usados na área de comunicação e marketing, que produz pôsteres muito melhores do que a ciência. Veja, por exemplo, alguns layouts muito criativos e lindos disponíveis no site Piktochart.
E depois que você fisgar o visitante?
Lembre-se: você não quer apenas fisgar os visitantes, você quer também que eles leiam seu pôster com atenção, fiquem intrigados com o seu trabalho e, a priori, aceitem as suas conclusões como válidas. Se você for bem-sucedido, as pessoas ficarão ansiosas pelo futuro artigo derivado do pôster, o que aumentará as chances de ele ser baixado da internet, lido, aceito e citado. Além disso, bons pôsteres ajudam a construir uma boareputação como cientista iniciante. Portanto, além de ser bem elaborado, seu pôster deve ter um bom conteúdo. Não adianta usar um belo pacote para embalar um presente ruim. Por fim, imprima miniaturas legíveis do seu pôster em tamanho A4 ou carta, faça cópias e deixe-as em algum tipo de suporte logo embaixo do pôster. Assim as pessoas poderão levar para casa uma propaganda mais rica do que o resumo que sai nos anais do congresso e não precisão fotografar seu pôster (a última moda nos congressos).  Inclua também alguns cartões de visita, pendurados junto ao pôster.
Dica final
Não entregue o ouro ao bandido! Como já disse, não apresente trabalhos preliminares. Primeiro, porque eles não estão concluídos, então ainda podem aparecer resultados conflitantes e suas conclusões podem mudar. Segundo, porque alguém pode roubar sua idéia! Enquanto não publicamos nossos trabalhos em boas revistas, nossas idéias não nos pertencem oficialmente. Se você apresentar uma pergunta interessantíssima e uma hipótese elegante em um congresso, seus colegas ficarão tão entusiasmados que um deles pode até correr, fazer o mesmo trabalho em paralelo e publicá-lo antes de você. Apesar de ser mau-caráter, ele não estará fazendo algo ilegal, pois ninguém é dono de uma idéia até publicá-la. Caso contrário, seria muito fácil sair por aí cuspindo idéias ao vento, nunca concluindo os trabalhos, acertando alguns palpites ao acaso, e se dizendo um pioneiro em tudo. Só apresente trabalhos já concluídos, que estejam prontos para serem submetidos imediatamente após o congresso ou que já estejam em revisão em uma boa revista. Pode apresentar também trabalhos recém-publicados; não tem problema algum!
Leituras importantes
Agradeço a diversos colegas que contribuíram com sugestões para este guia.
* Publicado originalmente em 2007.
Exemplos de bons pôsteres científicos bem-sucedidos em eventos reais
1. Nível: pós-doutorado – pôster apresentado por Luciana Lassance em 2014, na conferência da American Diabetes Association em San Francisco, EUA. Este é um pôster lindo e funcional, que serve como um excelente exemplo de que pôsteres científicos não precisam ser sempre verticais. Se o congresso em que você vai apresentá-lo te der essa liberdade, prefira o formato horizontal, que é muito mais agradável para a vista e eficiente para a comunicação.
poster luciana lassance
2. Nível: doutorado.
  • B. Pôster apresentado por Lucas Perillo no III Simpósio Brasileiro de Biologia da Conservação, no qual ele e seus colegas relatam a experiência de organizar uma conferência online através da Bocaina Conservação. O pôster ficou simplesmente lindo!
Poster_Bocaina_SBBC final 2015
3. Nível: iniciação científica – pôster apresentado por Tiago Y. Andrade (na época, aluno de iniciação científica) no IV Congresso Brasileiro de Mastozoologia em São Lourenço, MG, 2008, que foi muito elogiado por todos (o congresso infelizmente não tinha premiação oficial).

Fonte: https://marcoarmello.wordpress.com/2012/03/13/poster/, acessado em 29-set-15.

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