quarta-feira, 19 de abril de 2017

Warley Belo concede entrevista ao Estado de Minas

Violência na sociedade




Minas Gerais tem nove assaltos com morte por mês
Com os crimes contra o patrimônio em disparada nos últimos cinco anos, cresce a apreensão com a forma mais cruel: o assalto seguido de morte


postado em 19/04/2017 06:00 / atualizado em 19/04/2017 07:32
 Guilherme Paranaiba
Jair Amaral/EM/DA Press
Revolta e comoção no enterro da vítima mais recente: Adriana Maria da Cruz foi abordada em seu carro em shopping e enforcada por ladrões (foto: Jair Amaral/EM/DA Press)
A escalada no número de roubos nos últimos cinco anos por si só já espalha apreensão em Belo Horizonte e em todo o estado de Minas Gerais. Mas esse medo aumenta ainda mais quando assaltos terminam em morte, como aconteceu na capital com a vendedora Adriana Maria da Cruz, de 39 anos, e com o estudante de medicina veterinária Gabriel Araújo de Oliveira, de 21, em um intervalo de apenas dois meses. Desde janeiro de 2015, em média, nove pessoas perdem a vida da mesma forma todos os meses em Minas Gerais. Um quarto de todos os casos de roubo seguido de assassinato (latrocínio) ocorre na Grande BH, que tem média de duas ocorrências por mês no mesmo período, metade na capital.

Nos dois casos recentes de maior repercussão, Adriana foi assassinada no último dia 7, após ser sequestrada no estacionamento do ItaúPower Shopping, em Contagem, na Grande BH. Os criminosos queriam o carro, mas enforcaram a vendedora e jogaram o corpo às margens da represa de Vargem das Flores, na mesma cidade. Já Gabriel foi morto com um tiro no peito após ser abordado por ladrões que queriam seu celular, no Bairro São Gabriel, Nordeste de BH.

Minas teve 255 mortes em circunstâncias semelhantes de janeiro de 2015 a 10 de abril de 2017. Em Belo Horizonte, foram 31 casos no mesmo período, enquanto na Grande BH foram 64. Os dados foram fornecidos pela Polícia Civil e são registrados dessa forma no sistema toda vez que uma ocorrência de roubo deixa uma vítima morta, de acordo com a corporação. Especialistas acreditam que o contexto de disparada nos crimes contra o patrimônio em Minas e em Belo Horizonte nos últimos anos (veja arte) cria um rastilho de pólvora, pois os bandidos são inconsequentes e encontram na impunidade uma forma de crer que nada vai acontecer, mesmo se matarem uma pessoa em um assalto.

O coronel Marlon Jorge Teza, presidente da Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais, diz que a violência segue uma progressão. “A pessoa começa cometendo pequenos delitos e vai piorando, a ponto de não ver problema em matar uma vítima para conseguir o roubo, já que está amparada pela impunidade”, afirma o especialista em segurança pública.

O major Flávio Santiago, chefe da Sala de Imprensa da Polícia Militar em Minas Gerais, também entende que a principal questão nesse contexto é a impunidade. Ele destaca que a corporação chega a prender 30 vezes a mesma pessoa cometendo roubos, o que dá ao criminoso a sensação de que pode repetir os delitos. Ele também destaca que a influência de drogas pode levar a casos extremos, como a morte de vítimas, e por isso defende maior investimento em políticas públicas que busquem recuperar a saúde de dependentes que acabam cometendo crimes sob efeito de entorpecentes, ou por causa da abstinência deles. “Não existe uma regra seguida pelos bandidos, mas a experiência da Polícia Militar leva a acreditar que na maioria dos casos em que as vítimas reagem o desfecho acaba sendo uma vida ceifada”, afirma o militar, ressaltando que as pessoas devem sempre manter a calma em situações de roubo.

COMPLEXIDADE O advogado criminalista Warley Belo, mestre em ciências penais pela UFMG, acredita que atribuir o problema do latrocínio e da violência em geral à impunidade é um erro, pois entende que o problema está antes, durante e depois do crime. Ele acredita que, primeiro, pessoas que se tornam criminosas não têm acesso a educação, saúde e emprego. Depois, afirma, quando já estão no mundo do crime, há falhas no policiamento. “Nossa polícia técnica (investigativa), por exemplo, tem excelentes profissionais, mas falta tudo em termos de estrutura. O Estado não aparelha do ponto de vista material”, afirma. E, por fim, após a concretização do crime, o advogado sustenta que o problema se torna ainda pior, com a entrada nas cadeias, que deveriam servir para ressocializar, mas pioram a situação. “A cadeia acaba servindo de escola. Muitas vezes o criminoso comete um delito mais simples e é na prisão que vai se organizar em uma quadrilha para cometer crimes mais graves”, acrescenta.

Ainda segundo o criminalista, outra situação que reflete essa sucessão de problemas é a presença cada vez maior de criminosos “inexperientes” no sistema, que são os que tendem a ter reações mais agressivas em um momento de nervosismo, que podem acabar resultando em morte.

Para Marcelo Lacerda, marido da vendedora Adriana Maria da Cruz, assassinada sem ter reagido após o roubo de seu carro no estacionamento do ItaúShopping, é indispensável atuar na educação dos mais jovens. “É necessário um trabalho de conscientização sobre essa parcela da população. Eu coloquei como meta na minha vida a criação de uma fundação com o nome da minha mulher, que faça esse trabalho. Como vou viver sem a Adriana? Se querem roubar, que levem o carro, mas não tirem uma vida”, desabafa.

Edésio Ferreira/EM/DA Press

Polícia apresentou dupla acusada de executar universitário para roubar celular (foto: Edésio Ferreira/EM/DA Press)